Hoje falamos com o diretor-geral de uma das agências mais respeitadas no que concerne ao turismo de cruzeiros em Portugal, a GlobalSea CruiseXperts.
Fernando Santos é uma personalidade incontornável no setor dos cruzeiros, formador, produtor e autor do programa CRUZEIROS que passou, com sucesso, na SIC Notícias e SIC Internacional, é diretor-geral da GlobalSea CruiseXperts e representante em Portugal da Shore2shore, empresa espanhola de excursões para cruzeiros.
1) Como é que está a ser gerido o impacto juntos dos clientes e nas suas reservas?
A crise originada pela COVID-19 veio provocar na sociedade uma disrupção muito complexa. Tudo se coloca em causa, há incertezas, há medo, há receios…
Antes de os destinos estarem fechados, ou os operadores terem cancelado as viagens, ou os serviços programados, muitas reservas foram canceladas por iniciativa unilateral por parte dos viajantes. Depois, com alternativas na mão, temos analisado cada reserva e encontrado a melhor solução para o cliente.
Os clientes têm consciência da situação e preferem adiar para data posterior ou, pelo contrário, têm cancelado e preferem outro tipo de produto?
Não há uma Regra que possamos dizer que seja igual para todos. Apesar da GlobalSea CruiseXperts ser uma agência de viagens especialista no turismo de cruzeiros, caso o cliente pretenda usufruir do valor que confiou em nós para o seu cruzeiro (caso seja possível), temos as mesmas soluções que qualquer outra agência e viagens generalista. Aliás, reforçámos a equipa em Fevereiro, com um profissional experiente, com anos de experiência e com valências mais abrangentes, para irmos ao encontro dos nossos clientes que, para além de fazerem cruzeiros, também gostam de outro tipo de férias.
2) Podemos esperar que esses clientes possam ser recuperados sendo principalmente os estreantes os mais vulneráveis ou difíceis de recuperar?
Toda esta realidade é nova para todos, para quem tinha programado as suas férias ao longo de meses e anos, para muitos as primeiras, para outros também provavelmente as últimas, dada a idade avançada.
Por outro lado, quando não marcam todo o projeto de férias com a GlobalSea, ao haver uma situação como a que estamos a viver torna-se mais difícil coordenar datas e timings com todos, ou seja, os voos, os hotéis, os cruzeiros, ou as excursões de cruzeiros, poderão ter timings de adiamentos distintos. Naturalmente se não fizerem um seguro a situação pode complicar-se mais. Nós sempre fazemos um seguro, como todos os seguros de turismo sugeridos pelas agências de viagens, estes só cobrem os produtos turísticos que vendemos, por esse motivo, se o cliente não tratar tudo connosco fica muito mais complicado para o cliente.
3) Há indícios que apontam para um aumento do número de reservas para 2021. Estará relacionado com certeza com esta crise, os clientes preferem “saltar” 2020 e reservar já para o próximo ano?
Admito que haja um incremento de reservas para 2021, contudo não creio que seja significativo, pois as pessoas são as mesmas e não é por não viajarem em 2020 que em 2021 viajarão mais. O que se está a passar é o adiamento das férias provocadas por este confinamento e uma reserva com horizontes temporais mais largos.
Para estas férias de Verão, caso alguns destinos estejam fechados, a GlobalSea CruiseXperts tem algumas soluções alternativas para os nossos clientes e que são surpreendentes.
4) Várias foram as medidas tomadas pelas companhias para prevenir a entrada de passageiros com sintomas da doença. É de esperar que essas medidas possam ser prolongadas indefinidamente, ou pelo menos, até a COVID-19 estar controlada através de uma vacina?
As companhias de cruzeiros têm, ao longo dos anos, estado na primeira linha das medidas profiláticas e na prevenção de situações que ocorrem em terra, tentando evitar que doenças possam entrar a bordo.
Os procedimentos e o check-up do hóspede foram de imediato instituídos, visando evitar a entrada de potenciais infetados a bordo e que pudessem contaminar outros hóspedes saudáveis. Efetivamente em alguns casos houve contaminação, provavelmente por terem entrado assintomáticos e só mais tarde se terem revelado.
Terminaram há poucos dias cruzeiros à Volta do Mundo e por exemplo o MSC Magnifica terminou com “zero” casos COVID-19. Todas as medidas tomadas cumpriram o objetivo, e evitaram a entrada da doença a bordo, o que não invalida que tivessem havido cruzeiros que tiveram procedimentos sanitários de elevado grau e tiveram relatos positivos da doença.
Uma coisa é certa, entrar num supermercado, num espaço público, ou até entrar na Assembleia da República não se é tão rastreado como entrar a bordo de um navio de cruzeiros.
5) A higienização a bordo é, como sabemos, um dos factores mais importantes no controlo de doenças contagiosas a bordo. Deveremos esperar medidas de prevenção mais radicais, como a diminuição da capacidade de passageiros dos navios ou a proibição de entrada de doentes com determinadas patologias, ou até testes rápidos à doença (à semelhança do que tem feito a Emirates)?
Creio que neste preciso momento os armadores estão a equacionar todas as possibilidade de reativar e em segurança os seus navios e comercializá-lo da melhor forma. Há uma larga experiência nesse campo, a título de exemplo, lembro que há mais de dez anos, aquando da epidemia do H1N1, éramos rastreados no embarque dos cruzeiros, com câmaras térmicas e questionários que, entretanto, foram criados pela CLIA (Cruise Line International Association). Lembro de entradas em Southampton e vários portos no Mediterrâneo em que isso aconteceu, guardo alguns registos fotográficos dessa época não tão distante.
Agora não há novidade se acontecer, apenas é mais “visível” dada a importunância dada a esta questão, por outro lado, a limpeza de todos os espaços públicos passou a ser realizada a todo o momento. Todos os que fazemos cruzeiros, com mais ou menos experiência, passámos a ver na entrada do navio, ou na entrada dos restaurantes e buffets, funcionários com um spray para as mãos e até foram batizados de “washi-washi”. Já há 10 anos eu viajava com máscara e luvas.
O norovirus não é novidade para ninguém que faz cruzeiros… em Novembro de 2019, passei parte de um cruzeiro dentro de um camarote, é chato, é, mas tinha de ser, a segurança sanitária tem de ser levada a sério.
Se a circulação a bordo se fará de forma mais controlada; se teremos menos lugares sentados nos teatros e isso obriga a mais sessões de espetáculos; se o acesso aos buffets será diferente ou ainda o acesso aos elevadores será mais controlado, pois não sei, acredito que isso tudo esteja a ser bem tratado.
Acredito que teremos um “selo” para os navios limpos, tal como temos para a certificação energética ou ecológica, ou teremos para os espaços comerciais.
6) Todos os portugueses querem mais cruzeiros desde portos nacionais. Sabemos do esforço que as companhias têm feito para trazer os navios para Portugal. Não será o pós-COVID-19 uma altura ideal para haver mais embarques e itinerários diferenciados desde Portugal?
Entendemos que seria benéfico para os clientes portugueses que tivéssemos mais embarques nos portos portugueses, mais datas e mais companhias a explorarem o nosso mercado. Naturalmente, que os navios mais apetecíveis são sempre navios os mais recentes e mais tecnológicos, os que têm mais atividades para os hóspedes. Estes são normalmente navios de maior capacidade com 4, 5 ou 6 mil hóspedes, e o nosso mercado não comporta a emissão de elevados números de turistas de cruzeiros.
O porto preferencial para estes embarques seria Lisboa. Há muitas razões para que isso pudesse acontecer, a título de exemplo – tem aeroporto internacional, linhas de comboios, hotelaria para receber os turistas antes ou após os cruzeiros, atratividade da cidade, etc.
Temos outra variável, a geolocalização – cruzeiros com embarque em Lisboa teríamos itinerários até aos Países Baixos ou Grã-Bretanha, para o Mediterrâneo até Itália ou passando pelo norte de África ou Canárias.
Como não temos capacidade para meter durante uma temporada inteira (Primavera, Verão ou Outono), um navio com essas características ficamos então para o mercado português para os portugueses com meia dúzia de datas e duas companhias a fazerem itinerários de Lisboa até Itália e regresso, no fundo é o cruzeiro para os espanhóis um Barcelona-Barcelona, passando por Lisboa, ou para os Italianos, Genova ou Savona com escala em Lisboa.
Vejo com interesse os embarques no bonito terminal de Leixões, contudo a proximidade a Vigo, à Corunha e mesmo a Lisboa, não é uma primeira escolha por parte dos decisores terem muitos embarques a norte de país.
O Algarve sim, tem um enorme potencial. Seria essencial, em primeiro lugar, que o rio Arade tivesse mais condições para receber os navios que passam pelo Mediterrâneo ou cruzam o Atlântico e ter infraestruturas condignas e funcionais. O Algarve seria, em minha opinião, uma região a ser olhada e que traria um crescimento de escalas e até de embarques, quer pela proximidade ao sul de Espanha, aos turistas que habitualmente ficam no sul do país para férias ou que aí permanecem para jogar golfe. Este é um tema já muito debatido e ainda sem fim à vista.
O Funchal tem vindo a ter alguns embarques sobretudo para o próprio mercado local. Não nos podemos esquecer que para embarques em larga escala no Funchal, o aeroporto é um óbice, e que se relaciona com as aterragens e descolagens. Por exemplo, se um ou dois aviões não aterrarem para largarem turistas de cruzeiros, o navio não pode esperar… essa é já uma questão que é equacionada na rotação de tripulantes.
Passando em revista a possibilidade de maior ativação deste período pós-COVID-19, nos Açores, o porto marítimo de Ponta Delgada – Portas do Mar, é um porto de ligação entre o continente Europeu e Norte Americano. Contudo, e já o escrevi, os cruzeiros de exploração teriam sucesso, se percorressem essas lindíssimas ilhas Atlânticas, com navios mais curtos e de menor capacidade de hóspedes.